Francisco Gil

Contemplações

Francisco Gil

Teixeira Lopes: um retrato do infortúnio nacional

António Teixeira Lopes foi um dos mais notáveis escultores portugueses. Nasceu em Vila Nova de Gaia no mês de outubro de 1866, numa modesta casa próxima da Fábrica de Cerâmica das Devesas, onde o pai, José Joaquim Teixeira Lopes (1837-1918), ceramista e escultor, trabalhava. O contexto familiar onde cresceu, do desenho, da escultura e da cerâmica, atividades que o pai desenvolveu com algum sucesso, tiveram grande importância no futuro de Teixeira Lopes, filho. O pai, José Joaquim fora o autor da estátua de D. Pedro V da Praça da Batalha, no Porto (1862), tendo lhe sido atribuída uma bolsa de estudos que lhe permitiu realizar uma temporada em Paris (1864-1865) na Escola Imperial de Belas-Artes.

Mas, o que o terá impressionado mais foi provavelmente a obra escultórica de Soares dos Reis, “Flor Agreste” exposta em 1881 numa exposição coletiva no Centro Artístico Portuense. No ano seguinte, com 16 anos de idade, ingressaria na Academia Portuense de Belas Artes, onde foram seus mestres, Marques de Oliveira e o próprio Soares dos Reis cuja obra tanto admirava. Terminou o curso em 1884 e no ano seguinte obteve uma bolsa particular para estudar escultura em Paris. Depois de uma experiência que o desiludiu, na Escola de Artes Decorativas da cidade luz, realizou as provas de admissão às Belas-Artes, tendo se classificado em primeiro lugar. Participou nos anos seguintes no então importante Salon de Paris, que era na altura, o grande evento de exposições das Belas Artes. No Salon de 1889 obteve uma medalha de ouro com “A Viúva”, obra que o tornaria um dos grandes nomes da escultura portuguesa do século XIX.

A escultura “A Viúva”, uma das mais célebres esculturas portuguesas, é uma representação dramática de uma jovem mulher com o seu filho. Teixeira Lopes transmite-nos o desespero da jovem mãe, que se abeira da pequena criança que procura desesperadamente a mama. É uma imagem dramática, que se enquadra no sentimentalismo da época, tão bem caracterizado, por exemplo, com “O Desterrado” do seu mestre Soares dos Reis, ou em outras obras suas como a “Caridade” ou “A Dor”. Interessante também na visão deste dramatismo, a recorrente tristeza revelada em algumas obras naturalistas deste período, uma imagem do infortúnio sentido por uma geração de intelectuais sobre a estagnação e decadência do país.

Como refere José Teixeira (2005), “A Viúva” tal como a personagem do conto de Eça de Queirós, Suave Milagre, é uma desalentada figura do imaginário cristão que pela intercessão do filho que ergue os olhos ao céu numa indizível prece, supera o seu desamparo. Indício dessa relação dialógica é a presença de um terceiro elemento ambivalente/ausente n’A Viúva: o pai morto, metaforizado no olhar da mãe direcionado ao chão e o pai vivo, subjacente no olhar do filho voltado ao cimo e que pela elementar graciosidade da sua inocência alcança a graça divina.

O naturalismo da obra observa-se no delineado dos corpos e vestes. Duas figuras no espaço de um humilde quarto. A cena escultórica revela um berço com roupa enrugada pela agitação da fome da criança. São notórios, nesta peça a influência de esquemas escultóricos franceses, como a “Maternité” de Paul Dubois.
Em 1893, António Teixeira Lopes, regressa definitivamente a Portugal. O sucesso alcançado pelas suas obras permitiu-lhe que ao longo de toda a sua carreira receber encomendas, tendo sido um dos artistas plásticos portugueses mais bem-sucedidos profissionalmente. Faleceu em São Mamede de Ribatua, no dia 21 de junho de 1942.

“A Viúva”, obra em mármore está exposta no Museu de Arte Contemporânea do Chiado em Lisboa.

Leituras adicionais:
Teixeira, J. (2005). Teixeira Lopes, a viúva e outras figuras. Encontros de Escultura. - Porto, 2005, p. 11-22. http://hdl.handle.net/10451/30282