Musique-se
Paulo Cunha
Colher a música que se semeou
- Partilhar 31/05/2021
À medida que me
aproximo das quatro décadas a (tentar)
semear música a sul, continuo a ficar
desiludido com o que observo e com o que
muitos alunos me dizem ser o seu
conhecimento da música produzida na
região onde vivem com os seus pais. Ao
contrário do tempo em que tinha a sua
idade, é hoje possível, no Algarve, ter
uma oferta diversificada no que concerne
aos vários géneros e tendências
musicais. Mas se assim é, porque é que
continuo a ter uma média de 75% de
alunos dos segundo e terceiro ciclos de
escolaridade a responder-me que nunca
assistiram, a título de exemplo, a um
concerto ao vivo de uma orquestra ou de
uma banda de jazz?
É claro que de
pouco serve oferecer música sem antes
estimular os sentidos do potencial
consumidor/apreciador para a devida
fruição. Para que tal aconteça é,
obviamente, necessário plantar - de
forma continuada - o gosto pelas várias
formas de nos expressarmos através de
uma língua/linguagem comum – a Música.
Sabendo que é
desde os últimos meses de gestação da
mãe que se inicia o percurso de estímulo
para o pleno e abrangente gosto pela
música, foi o meu desiderato, há 20
anos, criar uma produção destinada aos
pais e bebés até aos 24 meses. Batizei-a
de “Música de Pais para Filhos” e, para
lhe dar corpo, chamei os mais
habilitados pais/músicos algarvios que,
tal como eu, acreditavam nos objetivos
da mesma.
Foi assim que
no dia 17 de novembro de 2001, na
Biblioteca Municipal de Faro, iniciámos
um percurso que, volvidas duas décadas,
fruto do desinteresse da maioria das
autarquias algarvias e por contingências
várias, terminou. Pretendíamos estimular
os sentidos; promover a audição passiva
e ativa; ensinar a distinguir
morfologicamente os instrumentos;
promover o conhecimento e identificação
dos timbres dos instrumentos; estimular
a interação e aproximação entre pais e
filhos; exercitar a memória tímbrica,
melódica e rítmica; promover a audição,
a seleção e a apreciação; potenciar o
desenvolvimento das várias competências
cognitivo/artísticas; estimular a
aprendizagem da música enquanto língua,
paralelamente à da fala.
Quase a celebrar
20 anos, seria interessante a entidade
produtora (Associação Cultural Música
XXI) juntar os progenitores e os então
bebés (felizmente registados numa
reportagem da RTP) para partilharem as
suas opiniões sobre de que forma as suas
participações nas várias sessões da
produção “Música de Pais para Filhos”
influiu na sua atual relação com a
música.
Conhecendo
alguns desses então bebés, tenho como
corolário e satisfação ver um deles a
ensinar, hoje, piano à minha filha.
Efetivamente, somos o resultado daquilo
que semeamos!
- n.25 • junho 2021