Paulo Cunha

Musique-se

Paulo Cunha

Colher a música que se semeou

À medida que me aproximo das quatro décadas a (tentar) semear música a sul, continuo a ficar desiludido com o que observo e com o que muitos alunos me dizem ser o seu conhecimento da música produzida na região onde vivem com os seus pais. Ao contrário do tempo em que tinha a sua idade, é hoje possível, no Algarve, ter uma oferta diversificada no que concerne aos vários géneros e tendências musicais. Mas se assim é, porque é que continuo a ter uma média de 75% de alunos dos segundo e terceiro ciclos de escolaridade a responder-me que nunca assistiram, a título de exemplo, a um concerto ao vivo de uma orquestra ou de uma banda de jazz?

É claro que de pouco serve oferecer música sem antes estimular os sentidos do potencial consumidor/apreciador para a devida fruição. Para que tal aconteça é, obviamente, necessário plantar - de forma continuada - o gosto pelas várias formas de nos expressarmos através de uma língua/linguagem comum – a Música. 

Sabendo que é desde os últimos meses de gestação da mãe que se inicia o percurso de estímulo para o pleno e abrangente gosto pela música, foi o meu desiderato, há 20 anos, criar uma produção destinada aos pais e bebés até aos 24 meses. Batizei-a de “Música de Pais para Filhos” e, para lhe dar corpo, chamei os mais habilitados pais/músicos algarvios que, tal como eu, acreditavam nos objetivos da mesma. 

Foi assim que no dia 17 de novembro de 2001, na Biblioteca Municipal de Faro, iniciámos um percurso que, volvidas duas décadas, fruto do desinteresse da maioria das autarquias algarvias e por contingências várias, terminou. Pretendíamos estimular os sentidos; promover a audição passiva e ativa; ensinar a distinguir morfologicamente os instrumentos; promover o conhecimento e identificação dos timbres dos instrumentos; estimular a interação e aproximação entre pais e filhos;  exercitar a memória tímbrica, melódica e rítmica; promover a audição, a seleção e a apreciação; potenciar o desenvolvimento das várias competências cognitivo/artísticas; estimular a aprendizagem da música enquanto língua, paralelamente à da fala. 

Quase a celebrar 20 anos, seria interessante a entidade produtora (Associação Cultural Música XXI) juntar os progenitores e os então bebés (felizmente registados numa reportagem da RTP) para partilharem as suas opiniões sobre de que forma as suas participações nas várias sessões da produção “Música de Pais para Filhos” influiu na sua atual relação com a música.

Conhecendo alguns desses então bebés, tenho como corolário e satisfação ver um deles a ensinar, hoje, piano à minha filha.  Efetivamente, somos o resultado daquilo que semeamos!

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