Paulo Cunha

Musique-se

Paulo Cunha

Música “very typical”

Haverá maior colonização de um povo do que a que é promovida pela apropriação, assimilação e disseminação de culturas alheias em detrimento da nossa?

Atente-se no exemplo que dou quando explico (em tom de graça) o baile mandado algarvio aos meus alunos: “Sabiam que o R.A.P. foi inventado no Algarve há mais de um século? Pois... Nos anos 60, um americano que cá estava a passar férias gostou tanto do baile mandado que levou a ideia para os E.U.A.  Como é um país enorme, o conceito de preencher a harmonia da música com o ritmo das palavras ditas, em menos de nada, transformou-se em Rhyme And Poetry e assim conquistou o mundo. Vejam lá!?” E não é que a partir desta (inocente) mentira, eles começam a olhar para o folclore algarvio doutra forma?! 

É claro que é triste ter de ir buscar exemplos ao estrangeiro para que os portugueses conheçam o seu património e assim o legitimem e valorizem. Não sendo nada a que já não estejamos habituados, na cultura e noutras áreas, confrange observar o desinteresse a que algumas franjas da cultura musical portuguesa são votadas, relegando-as a um esquecimento e abandono imerecidos. 

Não sendo contra a globalização cultural, antes pelo contrário, reconheço que é no poderio económico que, em grande parte, reside o segredo para colonizar musicalmente um povo. Cada vez mais, os media, as plataformas digitais de comunicação e as redes sociais têm vindo a ter um papel preponderante na entrada das “músicas de sempre” nas nossas casas. 

É inegável considerar que com a disseminação da oferta musical proporcionada pelas novas tecnologias aumenta o conhecimento de outras culturas, o que é enriquecedor, mas de que interessa se, por falta de interesse e de investimento no ensino e na divulgação do nosso património identitário, os mais novos não conhecem o que é genuinamente seu? 

Não deixa de ser paradigmático o que os turistas estrangeiros referem sobre a nossa música, classificando-a como muito rica, bela e “very typical”, quando, ao mesmo tempo, a mesma é tratada com desdém e indiferença por quem tem o dever de a promover e divulgar, dentro e fora de portas.   

Não, não é necessário mascarar nem travestir a música das nossas regiões, transformando-a naquilo que não é para assim chegar mais longe e a mais gente. Deem-lhe apenas a importância que lhe é devida e verão as marcas que a nossa história deixou no nosso património musical. Basta descobri-lo!

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