à Deriva
Fernando Vieira
A(des)gosto
- Partilhar 06-08-2021
Tinha eu tenra idade e escassa
noção do que me rodeava, já ouvia dizer que
os algarvios suspiram ao longo do ano pela
chegada de agosto… para ansiarem pelo seu
fim o mais depressa possível.
Salvo os exageros da ordem, esse
chavão não deixa de continuar a fazer algum
sentido, mesmo nestes dois últimos verões
flagelados pela Covid-19, pois a região
algarvia ainda é o destino preferido para as
merecidas e retemperadoras férias de muito
boa gente.
Este agosto não está a ser exceção,
a atestar pelos largos milhares de turistas
portugueses que ‘invadem’ as estâncias
balneares e os espaços de recreação
aquática, além das grandes superfícies
comerciais e dos restaurantes e similares.
Outros atrativos que o Algarve
possui, sobretudo naturais e culturais,
continuam a ser ignorados pela esmagadora
maioria dos visitantes que nos demandam… Mas
isso é outra estória.
Valha-nos, pois, o mercado
nacional, já que os turistas britânicos,
franceses, alemães e quejandos têm
enfrentado entraves de vária ordem – não
apenas sanitária – e estão temporariamente
apartados deste nosso cantinho, o que
origina um grave rombo na economia local.
Mas não é esse o principal problema
com que o Algarve se depara nesta época: os
fogos rurais e a seca severa também costumam
concorrer para agostos bastante agitados,
onde coisa que não falta são motivos para o
‘stress’ dos autóctones, vulgo algarvios.
Até ao momento, e felizmente, não
se têm registado incêndios de grande monta,
mas no que toca à crónica falta de água nas
nossas barragens, aí o caso muda de figura.
De acordo com o mais recente
boletim climatológico do Instituto Português
do Mar e da Atmosfera, no final de julho
mantinha-se a situação de seca meteorológica
em Portugal, com significativa parte do
Algarve em seca moderada e a preocupante
diminuição dos valores de percentagem de
água no solo, inferiores a 20 por cento.
Também desde pequeno, são
recorrentes os alertas para a desertificação
(irreversível…?) do nosso território, cujas
cotas das barragens na região raras vezes
ultrapassam médias pífias.
Ainda, e mais uma vez, faz décadas
que ouço e leio sobre uma provável rede de
barragens, de norte a sul, capacitada para
disponibilizar água onde e quando fizer
falta. Projetos e ideias que não passaram do
papel.
Portanto, e por tudo isto, agosto
leva-me a crer que – afinal – as tradições
ainda são o que eram. Nos casos em apreço,
para mal dos nossos pecados.
- n.27 • agosto 2021