Fernando Vieira

à Deriva

Fernando Vieira

Tânger, Portimão, Lisboa e Madrid

Num momento em que se volta a ouvir a sirene de alarme face ao recrudescimento galopante da estirpe Delta da Covid-19, e quando as expetativas da economia algarvia, direta e indiretamente ligada ao turismo, baixam consideravelmente pelo fecho de portas dos seus principais mercados fornecedores, eis que há quem vislumbre uma luz ao fundo do túnel na forma da ligação marítima (diária!...) entre Tânger e Portimão. 

Grandes entusiastas da medida, os marroquinos não se têm poupado a esforços nas últimas semanas para desbloquear o aparente impasse que o Governo português está a protagonizar, ao que tudo indica para não melindrar os interesses dos nossos vizinhos espanhóis caso a rota em causa saia do papel. 

Se assim for – e tudo indica que é – fica a questão: caso os protagonistas mudassem de posição, ou seja, os espanhóis a prejudicar negócios portugueses, vocês acham que Madrid não assobiaria cinicamente para o lado? Exemplos abundam sobre o ponto de vista de ‘nuestros hermanos’ relativamente ao nosso jardinzinho à beira-mar plantado… 

Seja como for, fontes geralmente bem informadas garantem-me que Rabat tem pressa para garantir a rota Tânger-Portimão, como forma de não depender em exclusivo dos caprichos espanhóis, mas está a perder a paciência pelo extremo cuidado com que Lisboa administra o processo. 

Em cima da mesa está a realização de duas viagens diárias entre o Norte de África e o Algarve, movimentando cerca de quatro mil pessoas por dia, sobretudo a comunidade emigrante magrebina. 

No cerne da questão residem profundas divergências político-económico-religiosas entre Marrocos e Espanha, que geraram uma crise diplomática tendo Ceuta como pano de fundo. Mas isso a nós, portugueses, pouco ou nada importará, pois se o que Rabat quer são alternativas, então que as proporcionemos, com os benefícios que daí advirão. E não me parecem poucos… 

Temos em perspetiva todo um novo mercado, até turístico, uma vez que as famílias marroquinas de classe média alta, com um apreciável poder de compra, passariam a frequentar a excelente oferta algarvia, que desconhecem totalmente, apesar de comungarmos de muitos laços culturais, inspiradores da paisagem urbana e dos hábitos gastronómicos algarvios, que certamente lhes serão familiares. 

Portanto, e salvo opinião contrária, esta é uma oportunidade de ouro, que poderá – e deverá – anteceder outras, caso sejamos legitimamente ambiciosos e tenhamos em perspetiva que o Porto de Cruzeiros de Portimão se assume como uma privilegiada porta de saída e entrada para o Mediterrâneo, tanto mais que a rede atualmente a ser tecida por Rabat inclui o porto francês de Marselha e o italiano de Génova, entre outros ancoradouros de renome.  

Conseguem imaginar Portimão e o Algarve envolvidos nesta teia marítima? A verificar-se, e até ver, isto soa-me a música tocada por anjo em harpa.

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