Fernando Vieira

à Deriva

Fernando Vieira

Impacto desproporcional

Acreditem que eu bem queria abordar um tema menos constrangedor, supérfluo até, a ver se dispersava as nuvens negras que pairam sobre nós. Mas não dá. 

Portanto, é com assumida resignação que volto ao tema recorrente dos malefícios que a atual pandemia trouxe à região algarvia, não apenas em termos pessoais, mas sobretudo no âmbito económico, e dos quais tardaremos a recuperar. 

Embora não tenha sido novidade para ninguém, certo é que um recente estudo do Observatório das Desigualdades concluiu que o Algarve é a região do país onde a pandemia está a ter um “impacto absolutamente desproporcional” e apresenta o maior aumento homólogo do desemprego. 

De referir que o Observatório é uma estrutura independente, constituída no quadro do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia do Instituto Universitário de Lisboa. O estudo, intitulado “Desemprego em 2020 - Impactos da Pandemia, Mapeamentos e Reflexões”, verificou “a inversão da trajetória de descida sustentada do desemprego, que vinha acontecendo desde 2012”, baixando regularmente de 710.652 pessoas oito anos antes, para 297.931 em janeiro de 2020. Contudo, “um repentino recrudescimento, mais notório a partir de abril do ano passado e que coincide com as primeiras medidas de confinamento, inverteu esta tendência”, colocando o total de desempregados registados em 375.150 no mês de dezembro. 

Os designados “desempregados imediatos”, que não beneficiaram do `layoff` simplificado, entre outras medidas indiretas de apoio ao emprego, foram sobretudo “trabalhadores mais precários, informais, trabalhadores independentes, falsos recibos verdes, em suma, gente vulnerável com vínculos contratuais frágeis ou simplesmente inexistentes, aos quais se juntaram os que estavam em período experimental e não continuaram”. Ou seja, o que mais há por terras algarvias. 

Particularizando a análise, com foco na atividade económica concreta, os investigadores verificaram que os desempregados são provenientes sobretudo do alojamento, restauração e similares. E é aqui que mais nos toca. 

Segundo o relatório em causa, que analisou o mercado de trabalho em Portugal continental durante o ano de 2020, com base em dados do Instituto do Emprego e da Formação Profissional, “o setor do turismo continua a ser largamente penalizado pela pandemia”, tendo os investigadores feito questão de salientar que no caso do Algarve “o fenómeno é ainda mais expressivo”. 

Avançam mesmo que na região “a pandemia está a ter um impacto absolutamente desproporcional, explicado em grande medida pelo facto de ser muito dependente da atividade turística”, salientando que os dados do desemprego registado são “inéditos”.  

Se dúvidas houvesse, aí estão as evidências plasmadas em números, …que demorarão bastante a ‘normalizar’. Acontecerá isso algum dia?