Afonso Dias

reflexões in verso

Afonso Dias

poema para jovens como eu

poema para jovens como eu

enorme era o quintal e era o tempo
gigante o pai e forte mais que a noite
a distância mais longa do que o vento
desmesurada a espera pela aurora
tudo era imenso na verdura
pequeno era só eu sei-o agora

no tempo cresce o corpo mirra a ideia
mingua o linho novo em água fresca
encolhem os lugares e as figuras

passo a passo menos são os passos
carecidos pela fome do caminho
e se tudo se aclara na viagem
mais pequeno se faz o que atrás fica

atenta pois nas redes e nos ecos
que mordem as canelas da frescura
lembra-te antes do vermelho gordo
que tinham os morangos pelas leiras
no tempo em que tudo era à medida
do tamanho exacto da doçura

sempre que voltares à casa velha
verás a antiga escola pela sombra
que alaga o cristalino nos teus olhos
e apouca a redonda arquitetura
sem arestas a acoitar papões
(que grande era o recreio que afobava
no um-dó-li tá do mata e dos piões)

melhor que não voltes antes deixa
no teu olhar que tudo guarda inteiro
o tamanho das coisas que elas tinham
no corpo que elas são o que elas eram

e se quiseres há-de quedar intacta
a estatura de tudo   a verdadeira
como ela era antes da saudade
que sempre se quer alongar sozinha

conserva os risos claros desdentados
e os de dentes novos   incompletos

a caçoarem dos teus nervos inquietos

30.11.2021

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